Como se livrar do enochato?
Pagando de bacana numa cave do Porto, Portugal
Existem duas coisas na vida que eu já desisti de compreender: plano de celular e vinhos.
No primeiro caso — como todas as questões tecnológicas — deixei por conta do Raul. No segundo, pane total, porque ele também não bebe. E quanto menos a gente entende, mais aparecem amigos tentando explicar a importância dos taninos.
Sabe aquele indivíduo que numa reunião qualquer (tipo, batizado do sobrinho) faz cara de entendido, ergue a taça, analisa o corpo da bebida, enfia o nariz no copo e decreta: aroma de trufa branca com beterraba francesa e notas de cardamomo.
Não existem limites para a atuação do enochato, alcunha derivada do termo enólogo, aquele ser superior com a língua mais apurada da ordem celestial.
Os enochatos se revelam em jantares informais ou num restaurante estrelado. Geralmente implicam com a carta de vinho e com o mestre sommelier. Com apenas um gole já sabem: reflexos violáceos de repolho cozido adocicado com fundo de peroba rosa no retrogosto.
Oi?
Não existe nada de errado na apreciação do vinho. Essa coisa de olhar contra a luz, girar a taça, cheirar a rolha são características importantes para descobrir se a bebida está dentro de um padrão razoável.
Mas o enochato (que pode até ser um enólogo) não sabe a hora certa de fazer isso, quase sempre é um exibido na frente de leigos boquiabertos e estarrecidos. E deuzolivre se você cometer o pecado mortal de dizer que gosta de um rosé.
O enochato é jactancioso e inadequado. Tipo o bicho besta mesmo!
São seres quase sempre de conhecimento raso, que se aproveitam de nossas limitações sobre o tema para exercer um vocabulário rebuscado sem pé nem cabeça.
Observe que o protagonista é sempre ele, nunca o vinho. O enochato precisa de plateia. Portanto, não seja você a dar palco pra maluco.
Sendo obrigada a conviver com essa pessoa sinto-me na obrigação de tirar o indivíduo desse delírio. O truque é simples: finja que sabe mais do que ele.
Pergunte sobre o motivo dos chilenos terem trocado os parreirais de Baquedano pelos vinhedos de Tobalaba. (Ele mal deve saber que você está falando de duas estações de metrô de Santiago.)
Aponte uma questão técnica avançada: qual o impacto do coronavírus na produção dos vinhedos gregos?
Ele imediatamente vai voltar para o seu mundo de reclamações (todo enochato nasce da lamúria) para mudar de assunto.
Esse é o momento de você levantar a taça levemente na altura dos olhos e dizer: aqui temos um quê aveludado, lembra açafrão marroquino colhido antes do amanhecer com notas de fumo de corda e café damasco coado em filtro de seda italiana.
Incrédulo, ele vai te interromper mais uma vez (enochatos são incansáveis, já aviso) para perguntar, então, qual é o melhor vinho para você:
— O próximo, more!
— Mas qual?
— O Dom Quemidón! O quemidón, eu bebo!
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hahahahaha…já trabalhei revisando textos e sempre achei bizarro ler esse tipo de coisa: " Esse elegante vinho reflete a fiel expressão desta cepa, com uma cor intensa e profunda que, junto com os aromas de frutos maduros, harmonizam com os toques de baunilha entregues pela guarda em barris."
Sinistro…
pra melhor entendimento do meu comentário anterior: eu revisava os catálogos de vinhos de uma grande importadora…
Adorei! 😀
Meu, mas esse peseudo-conhecimento é uma chatice mesmo! rarararara. Morri de rir!
Ops, PSEUDO!
Eu amo vinho,de preferencia Zinfandel,tinto. Nao entendo nada
da cepa da uva, da baunilha do barril, do aroma isso e aquilo. Mas eu ja viajei no trem do deus Baco.
Silvia da uma checada no link.
http://winetrain.com/lunch/gourmet
Bjs
mara
Perfeito! Dia desses li (e adotei) que "o melhor vinho é aquele que a gente gosta". Né não?
Eu diria mais: o melhor vinho é o que está no copo no momento! rsrs
O melhor vinho é aquele que a gente divide com as pessoas queridas, falando muita bobagem e dando muita risada.
Oi Silvia! Que post maravilhoso! É quase como um grito de liberdade! Eu tenho um verdadeiro "enojo" de "enochatos" e até escrevi sobre isso lá em casa (http://buenosairesdreams.blogspot.com/2009/03/vino.html). Adorei as descrições que você usou! Perfeito!!
Sensacional! Que preguiça desse povo que jura que entende de vinho, socorro! Silvia, voce é a criatura mais espirituosa que conheço. Bjos
kkkkkkkk…amei esse post!
Adorooo vinho tinto, mas só fico no esse eu gostei, esse não e ponto final!
Hahaha – taaaao verdade 🙂 Tem um amigo do meu marido que é casado com uma francesa: os dois sao meio enochatos, e só gostam de vinho francês. Como meu marido é catalao, e a regiao tem vinhos ótimos tbm, muitas vezes compramos vinhos de lá e o amigo dele meio que tirava sarro. Até que uma noite eles vieram jantar lá em casa e namorido serviu um vinho (num decantador) catalao que estava ótimo. O amigo disse: 'Que ótimo esse vinho. É francês com certeza, nao?', e namorido disse: 'Naaaaaao, é catalao'. Ele só acreditou quando viu a garrafa e o rótulo. Adoreeeeei a cara de eno-tacho dele, hehehe! 🙂
Beijos, Angie
P.S. Obrigada pela dica das fotos!!! Eu sou mega leiga em blogs, só sei o mínimo, nao tenho a mínima idéia como usar o scribe fire 🙁 Mas quando tiver tempo vou sentar e investigar, obrigada pela dica 🙂 Enquanto isso, se você clicar em cima da foto, ela deve amplicar para o tamanho da tela (eu acho).
A propósito, lindao o movimento do vinho nessa foto!!!
Olá
por cá é o mesmo… e eu não percebo nem de vinhos (mas gostava), nem de tarifários.
A par da extensa conversa sobre os aromas vínicos, as listas de pratos dão longas descrições dos mesmos, para dar conta do nível de softiscação e criatividade dos chefes. Imagino que no Brasil seja o mesmo.
Cheguei aqui via VnV e achei imensa graça ao seu blogue.
Já o coloquei nos favoritos.
Beijinhos
Isabel
Me acabei de rir com esse texto! Acontece exatamente como vc descreveu! O duro é que eu tenho um marido sommelier e vira e mexe vou em alguma degustaçao com ele. E dai, sem perceber, me pego segurando a taça pela haste e, pior, alem de girar a taça acabo tambem enfiando o nariz bem dentro dela (nada elegante!) pra tentar sentir algum cheiro desses. Nem preciso dizer que nunca dei conta, né?
Mas pior que "enochato", agora por aqui tá uma moda de "hidrochato". Vc acredita que eu fui em uma degustaçao de agua?
Pois é… 🙂
Olá! Gostaria de parabenizá-la pelo Blog! Gostei! Achei divertido!
Será que você poderia me passar um email para eu escrever diretamente?
Abracos,
Cris
(micha.ella@hotmail.de)
Olá! Nosso e-mail é matraqueando@gmail.com!
Abs!
Eu simplesmente AMEI este blog! Já li praticamente todos os posts e quero agradecer a parte de dicas da Europa, me deram uma ajuda imensa!!!
E meu sonho é conseguir identificar um aroma frutado com trufa e café em um vinho heheheh
Comecei meu blog ontem, sobre viagens e temas relacionados. Dá uma olhada e espero que goste! Já estou seguindo este 😀
Bju
Pri
Gostei! São pedantes além de chatos…
Beijinhos
rsrsrsrsrs! Acgei genial! Gosto de beber vinho, mas não sei nada, só se gosto ou não. E pode ser qualquer um! Beojo
Sil, ameeeei este post, só achei ele agora 🙂 Detesto os enochatos também! Outro dia numa degustação a pessoa do meu lado dizia que tinha sentido gosto de “pedra de isqueiro” o___O
Adoro tomar vinho, participo de uma confraria, mas sempre falamos que estamos ali para garimpar boas “relações preço-qualidade”, para conhecer novos vinhos, para termos mais facilidade para escolher nas cartas de vinhos de restaurantes e, mais importante, para nos divertirmos 😀
Silvia, adoro suas dicas de viagem e gastronomia, essa do enochato é mara como dizem alguns. Sempre recomendo a amigos que antes de viajarem deem uma olhada nas suas dicas.
Eu n gosto de vinho, cerveja, nem uisque. Mas para “algumas pessoas” curtir uma taça de vinho é lei, e quem simplesmente n gosta n é uma pessoa chique, rsrs … Qual a relação entre as duas coisas? Gostar e conhecer um tipo de bebida n torna ninguém isso ou aquilo, é uma questão de gosto pessoal, e um direito também. Chique , moderno e cool é sermos sempre nós mesmos, e não seguir tendências, modismos, n é verdade ?!
Cara, muito bom este post!
Gargalhei aqui Silvia! Eu participo de uma confraria de aprecidaodres de vinho e nós já tivemos até um encontro para não sermos como um desses enochatos! Parabéns pelo texto!
kkkkkk amei
isso varia do paladar de cada um eu acho
Olá Silvia,
Apreciar um bom vinho, na melhor companhia e naquele momento especial, é algo prazeroso e que cabe em qualquer bolso.
Existem vinhos caros e bons e, ao mesmo tempo vinhos baratos e bons.
Aqui na Pousada Refúgio Monte Olimpo frequentemente nos deparamos com alguns “pseudos conhecedores” do néctar dos deuses.
A casa dispõe de uma pequena carta com alguns rótulos, incluindo Chilenos, Argentinos e os Nacionais.
A Serra Catarinense produz bons vinhos e merecem destaque especial, além da nossa preferência.
Como bom Pousadeiro gosto de contar causos, e lá vai um:
Certa vez acolhemos um pequeno grupo e, no jantar, pediram para que fossem servidos os vinhos que trouxeram (só lembrando que cobramos uma taxa – rolha – para tanto).
Anotamos os dados do rótulo e, quando fomos ao supermercado, conferimos o valor de um igual que estava à venda na gôndola.
Qual não foi a nossa surpresa ao constatarmos que custava a metade do valor que foi cobrado pela rolha.
Hahahaha! Muito boa história! E ainda tem essa, o enochato quase sempre acha que vinho bom é vinho caro!
Finja que sabe mais do que ele. hahahahaha muito bom!!!
Amei! hehehe Ninguém aguenta um ser esnobe tentando demonstrar conhecimento sobre vinho. Uma vez, visitando um château na França (château, não é chato!), a senhora, que produzia um vinho branco maravilhoso, simplesmente disse que “o melhor vinho é aquele que você gosta e pode tomar em boa companhia” – simples assim. Sem frescuras, sem vocabulário rebuscado. Simplesmente amei!
Obrigada pelo artigo de qualidade