Alcântara: roteiro para um bate e volta desde São Luís

Publicado por: Silvia Oliveira Alcântara

O pequeno município de Alcântara deveria ser o bate e volta padrão saindo de São Luís se a maioria dos turistas não fizesse da capital apenas um ponto de passagem para os Lençóis Maranhenses. Mas quem se dá ao luxo de ficar uns dias a mais por aqui vai descobrir um dos cantinhos mais charmosos e pitorescos do nordeste brasileiro.

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O acesso é feito por barco — 1h20 de viagem em alto mar com direito a ondas altas e gente mareada com o sobe e desce da embarcação. Sinceramente, quase desisti ao ouvir relatos sobre a travessia. Morro de medo de água e fico enjoada fácil até na banheira da minha casa.

A bem de verdade eu fui achando que ia encontrar uma espécie de Colonia del Sacramento (cidade histórica uruguaia linda de viver, onde também se chega via barco vindo de Buenos Aires.) É que me disseram que o centro histórico de Alcântara estava mil vezes mais conservado que o de São Luís. Só que, lição nº 01: nunca, nunquinha vá conhecer um lugar com expectativas de que ele lembre outro que você já visitou… e gostou muito.

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Fato, o casario é bonito e a cidadezinha, cheia de história para contar. Mas não é Colonia del Sacramento com sua infraestrutura e restaurantinhos de charme. Até porque, no vilarejo uruguaio o doce manjado é o alfajor e aqui, e só aqui, você encontra o famoso e perfeito Doce de Espécie. O acepipe — herança portuguesa — é feito à base de coco, crocantinho por fora e molhadinho por dentro. Custa R$ 10 uma bandeja com seis unidades. Ponto para Alcântara.

Um passeio guiado é muito recomendado em Alcântara, principalmente para quem chega cedo e vai embora no fim do dia, meu caso. O lugar é mais um daqueles do Brasil Colonial com histórias de apogeu e decadência, portanto cheio de causos sobre os barões e seus escravos.

Contratei um guia chegando à cidade, mas o cara era tão ruim, mas tão ruim que no final eu — que havia lido moooito sobre a cidade — já estava dando dicas pro rapaz. Mas isso não é a regra. Foi falta de sorte minha, imagino.

Logo na chegada a Alcântara, no Porto Jacaré, há um centro de informação turísticas que oferece mapas (pagos à parte) com banheiros e venda de água, refrigerante e sorvete. (Vai por mim, você vai precisar!

Alcântara está grudada na Linha do Equador e o calor ali é sub-humano para seres que vivem em Curitiba como eu. (A cidade tem, em média, dois ou três graus a mais do que São Luís.) Dali, você sobe a Ladeira do Jacaré rumo à Praça e Capela das Mercês (foto abaixo).

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Em seguida, rume para um dos pontos principais, a Praça da Matriz — onde estão as ruínas da Igreja de São Matias (século 17) — a foto clássica de Alcântara.

No mesmo quadrilátero, em frente às ruínas, estão o Pelourinho, o casarão que abriga a Prefeitura e a Câmara de Vereadores  (que já foi uma penitenciária) e o Museu Histórico de Alcântara com fachada revestida com os clássicos azulejos portugueses.

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De tudo o que viria depois, esse foi o lugar de que mais gostei na cidade. Estava tudo calmo, silencioso (fui num dia de semana) e havia uma brisa constante para aliviar o sol escaldante.

Da Praça da Matriz, partimos para a Rua da Amargura, uma viela cheia de lendas e ruínas. Para alguns, a via recebeu este nome porque era por onde os escravos passavam quando seriam castigados. Outra corrente afirma que o pequeno trecho de chão batido — onde havia muitos casarões da nobreza — recebeu este nome porque dali as mães se despediam dos filhos que iam estudar em Lisboa.

No final da rua você encontra o que sobrou do antigo Palácio do Negro, onde os escravos eram comercializados. O resultado, independentemente do conto, é que o beco rende belas imagens para o seu scrapbook.

Como em toda cidade colonial brasileira, Alcântara preserva uma penca de igrejas barrocas e seus altares em rococó. A Igreja Nossa Senhora do Carmo é uma delas.

Mas o mais interessante, na minha opinião artístico-arquitetônica limitada, são as ruínas (que ficam em frente e ao lado da igreja) de dois palácios que começaram a ser construídos por barões inimigos numa disputa para ver quem ia hospedar Dom Pedro II — que há tempos prometia uma visita à cidade. No final das contas, a visita nunca aconteceu e as obras foram abandonadas.

Um pouco mais adiante, a visita à Igreja Nossa Senhora Rosário dos Pretos foi fantástica. Ali ouvimos os causos do Seo Benedito, descendente de africanos escravizados que contou, entre outras coisas, que a missa aqui começava depois e terminava antes, porque os negros tinham que deixar, primeiro, os sinhozinhos na missa dos “brancos” e depois buscá-los no final.

Por fim, Seo Benedito (camisa vermelha) deu uma demonstração, dentro da igreja, do Tambor de Crioula — ritmo de origem africana praticado pelos escravos em homenagem a São Benedito e que ganhou o título de Patrimônio Imaterial Brasileiro em 2007.

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Em frente à Igreja Nossa Senhora Rosário dos Pretos está a Casa de Cultura Aeroespacial, uma espécie de centro de interpretação do CLA – Centro de Lançamento de Alcântara.

A base foi criada em 1989 e não está aberta à visitação (só o centro). Não à toa, Alcântara foi escolhida para ser uma base espacial.

A cidade está a 2 graus do Equador, posição geográfica privilegiada que ajuda no lançamento de foguetes com economia de 40% de combustível.

Antes da visita propriamente dita, você assiste a um vídeo explicativo sobre o funcionamento do projeto e conhece alguns tipos de foguetes. Abre todos os dias das 10h às 16h. Grátis.

Almocei no Restaurante Cantaria (fotos acima), onde comi maravilhosamente um peixe na telha com camarão ao molho e três tipos de arroz: branco, vermelho e cuxá.  Eu estava sozinha e eles fizeram meia porção (e quase não dou conta de comer tudo!)

Ao lado do restaurante Cantaria está outro atrativo turístico da cidade, a Ermida de Nossa Senhora do Desterro, também conhecida como a igreja dos sinos. O local, assim como o próprio restaurante, tem vista privilegiada da Ilha do Livramento e Baía de São Marcos.

Listados os atrativos, o mais interessante no vilarejo é observar — e imaginar — o que foi Alcântara há três, quatro séculos. A agitação e gramur de antigamente deram espaço à calmaria e à memória preservada.

Não senti vontade de dormir na cidade (como aconteceu em Colonia del Sacramento, onde também fiz um bate e volta), mas imagino que o aproveitamento seria bem melhor se você passasse uma noite aqui.

Não que você não possa conhecer o básico em quatro horas, mas ao ficar um dia a mais em Alcântara você pode optar em fazer o passeio pelo centro histórico em horários menos escaldantes (bem no comecinho da manhã ou no fim de tarde).

Sem contar que, com mais tempo, você consegue visitar algumas praias como a da Baronesa e Itatinga e ainda fazer o passeio à Ilha do Livramento (10 minutos de barco de Alcântara) para ver a revoada dos guarás ou à Ilha do Cajual, um importante sítio arqueológico do Maranhão.

SERVIÇO

Como chegar a Alcântara

1. Pegue um catamarã, escuna ou lancha no Terminal Hidroviário Praia Grande, que fica ao lado do principal terminal de ônibus (Terminal da Integração) — a umas duas quadras do centro histórico.

2. Os horários de saída dependem da maré, mas geralmente são 7h e 9h30 com retorno previsto às 8h30 e 16h. Ligue antes para confirmar: (98) 3232-0692.

3. O bilhete custa R$ 15 por trecho. Ou seja, são R$ 30 para ir e voltar. (Valores de agosto de 2018)

Dicas da Matraca

1. Com muita sorte você pegará um mar tranquilo para fazer a travessia. Mas, normalmente, o que ocorre é uma viagem incômoda e difícil até para quem não costuma enjoar. Sugiro que você tome um Dramin ® (eu comprei aquele que não dá sono) uns 40 minutos antes de embarcar. Tanto na ida quanto na volta.

2. Leve protetor solar, chapéu e vá com roupas leves e sapato confortável.

Alcântara combina com:

São Luís

Raposa

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